Do guarda roupa para o cabideiro: A moda circular ganha espaço e vira alternativa entre diferentes públicos da cidade
A cerimonialista Maysa Fonseca, após perder a mãe, herdou roupas de traje guardadas por ela, e utilizou essas peças como incentivo para começar o brechó “De mãe para filha”. Para Maysa, foi uma forma de se reconectar com a mãe. Ela sentiu a necessidade de movimentar as sacolas guardadas com roupas: “Dei logo um chutão na porta e disse: bora!”. Começou vendendo as peças de forma online, no perfil do Instagram e, hoje em dia, tem loja física no bairro do Mangueirão.
Algumas roupas que Maysa vende são doadas, mas a maioria é por consignação, que para ela estimula a circulação de peças, já que várias pessoas têm roupas “paradas” no guarda-roupa. O brechó é feito por materiais reutilizados, e também transforma e reutiliza as peças para vender. Algumas roupas estocadas, muito pequenas, são reformadas para aumentar ou simplesmente para dar um charme a mais. Quando estava reunindo material para abrir sua loja física, contou com a ajuda que pôde. “Customizamos as araras pros tamanhos que a gente precisava, o MDF que a gente encontrava na rua (risos)...”
Assim como Maysa, a partir da pandemia da Covid-19, com a quarentena em 2020, diversos perfis de brechós foram criados no Instagram, a maioria com o intuito de gerar uma renda extra, mas todos com um objetivo comum: a sustentabilidade. A moda sustentável é uma importante estimuladora do consumo consciente e tem se expandido cada vez mais. Essa crescente visibilidade, que se vê consolidada nos dias de hoje, principalmente com os Encontros de Brechó, onde o brechó de Maysa participa, deve-se ao objetivo ecológico que eles trazem. Vendendo produtos de alta qualidade a preços mais baratos que os das grandes lojas de moda, os brechós têm o diferencial de não terem roupas novas, assim tornando-se menos prejudiciais ao meio ambiente.
A sustentabilidade presente na venda de peças de segunda mão traz consigo o rompimento com a “moda rápida”, em que itens estão sempre saindo de alta e há uma busca incessante por novas roupas e um consumo contínuo. Os brechós ajudam a mostrar que as peças, sendo de segunda mão, ainda podem receber novos donos e ser reutilizadas.
As peças de segunda mão são uma maneira viável e mais barata de combate ao aumento das taxas de desperdício. Segundo uma pesquisa publicada pela Global Fashion Agenda, a indústria da moda é a segunda mais poluente do mundo, formada pelo consumo em massa todos os anos, que é aumentado pelo sistema capitalista, ao direcionar as pessoas a comprar sem ter consciência dos efeitos disso. Pensar em sustentabilidade e em consumo consciente é quebrar com esse padrão para garantir que as taxas de poluição não continuem a subir, mesmo que em baixa escala. “A gente acredita que, cada um fazendo um pouquinho, a gente vai conseguir um mundo melhor”, reitera Maysa.
Com oficinas de empreendimento e palestras, os encontros de brechós acontecem em alguns finais de semana e em diferentes locais da cidade. Contribuem não só para o consumo consciente, mas também para a administração dos brechós, a cultura paraense e a gastronomia. Porém, da mesma forma que educam e abrangem o conhecimento ecológico e sustentável, também restringem o seu público. O centro da cidade de Belém continua sendo o principal palco de visibilidade. O contraste entre os vendedores de brechó com maior evidência e aqueles que vendem majoritariamente para a população dos bairros também se mostra existente.
Dona Jô, proprietária de um brechó localizado no Guamá há 23 anos, afirma que o estabelecimento é sua única fonte de renda e que, apesar da grande procura por roupas mais acessíveis, a concorrência é um dos fatores que contribuem para o baixo número de vendas. Por conta da baixa visibilidade, seus principais compradores são moradores do bairro. "Tem dias que não vende nada, tem dias que vende um pouco. É muita competição. Quando eu vim pra cá, tinha mais lucro. Hoje em dia não consigo guardar um real. Não posso reclamar, porque eles também precisam", diz a vendedora.
Motivada pelo contato com o mundo da moda e pelo consumo consciente, Emily Ediany, aluna de jornalismo pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e designer de roupas, relata a forma como ela encaixou sua visita a esses espaços no seu cotidiano. "Embora tenha muitos brechós aqui no meu bairro, eu comecei a frequentar os do centro de Belém. Sempre que eu ia no comércio comprar maquiagem ou resolver alguma coisa, eu acabava passando nos brechós de lá". A concentração comercial no centro de Belém também é um fator que os frequentadores de brechó levam em consideração para escolher o local de compra. Os clientes costumam visitar espaços que estejam no seu trajeto habitual, por isso, apesar de ter opções próximas da sua residência, eles optam pela facilidade e agilidade.
Para além da sustentabilidade, a moda circular também perpassa por questões econômicas e de autoconhecimento. Esses lugares permitem
que as pessoas construam um estilo próprio por um preço mais acessível, fugindo do convencional. Para muitos, esse ponto positivo é o principal fator para comprar em brechós, por sentirem a segurança e o sentimento de fazer sua própria moda e estilo, desvinculando-se das tendências. No decorrer dos anos, a forma de consumir mudou, levando esse mercado a se modificar. Hoje está diversificado e atende vários nichos, cada um com um público alvo diferente.
"Eu queria ser estilosa. Só que não dá pra renovar o guarda-roupa inteiro ou se vestir do jeito que você quer se você não tem muito dinheiro… pelo menos eu achava isso. O brechó foi uma alternativa que eu encontrei. Garimpando, eu consigo achar peças que eu gosto muito, que são confortáveis e bonitas por um preço acessível. Também gosto muito de fazer upcycling, que é fazer customização nas roupas e dar um novo sentido a elas.", finaliza Emily.
Mesmo não sendo um trabalho fácil, com o aumento dos brechós, mais consumidores são alcançados e conseguem evidenciar que é possível ter seu próprio estilo de maneira ecológica, educando sobre o consumo sustentável e apartando o significado da moda com o que está em alta.
Por Isabella Gabas e Vitória Balieiro
Se interessou pela moda circular para começar a comprar sustentavelmente? Conheça alguns brechós em Belém:
@espacodelasmac - Shopping João Alfredo - Campina, Belém;
@demaeparafilhabrecho - Avenida Norte, 11 - Mangueirão, Belém;
@pinguinhobrecho - Rua Domingos Marreiros, 727 - Umarizal, Belém;
Brechó Igreja dos Capuchinhos - Tv. Castelo Branco, 1541 - São Brás, Belém;
@anamartinsbrecho - Shopping João Alfredo - Campina, Belém;
@_brechodadeia - Tv. Rui Barbosa, 676 - Reduto, Belém;
@ecostylusbrecho - Av. Boulevard Castilhos França, 284 e 290 - Campina, Belém;
@colabrechobr - Encontro de brechós;
@edasmanas - Encontro de brechós;
@boragarimpar - Encontro de brechós;
Brechó da Jô - Rua Barão de Igarapé Miri - Guamá, Belém;
@cintilant.brch - Brechó Online;
@y2kbrexo - Brechó Online;
@maladeouro - Brechó Online.
Interessante a abordagem entre a moda circular e a sustentabilidade, ótimas indicações 👍
excelente pauta!!! muito muito pertinente!