Anunciada como sede da 30ª Conferência das Partes da ONU, Belém passa por melhorias na infraestrutura enquanto enfrenta desafios climáticos intensificados pelo aumento das ilhas de calor
Belém será sede, um evento que visa discutir mundialmente questões relacionadas aos impactos ambientais. Os olhos do mundo estarão voltados para a capital paraense. As temperaturas estão se intensificando cada vez mais e Belém, conhecida como a “Cidade das Mangueiras”, lidera o ranking das cidades menos arborizadas do Brasil. Os corredores de árvores nas principais ruas do centro da capital e espaços verdes como o Bosque Rodrigues Alves e o Museu Paraense Emílio Goeldi não são suficientes para conter as ondas de calor.
Esse aquecimento que atinge a capital é um fenômeno previsível, causado pelo acúmulo de construções civis, como prédios e pavimentações, que retêm o calor e o dissipam de forma mais lenta. Com a falta de arborização em Belém, que no ano que vem será sede da 30ª Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas, a COP 30, o cenário climático se agrava para quem vive na cidade.
O aumento de construções para abrigar eventos e atividades relacionadas à conferência pode intensificar ainda mais esse efeito. Novos edifícios e infraestruturas exigem o uso de concreto e asfalto, que não apenas absorvem calor, mas também dificultam a circulação de ar natural. Não tem sido implantada medidas adequadas para mitigar esse impacto.
“É como se fosse um buraco na floresta, e aí, como a cidade é feita de concreto e asfalto, as ondas do sol ficam retidas nas construções, armazenando calor”, afirma o professor Luiz Augusto Silva de Sousa, da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA).
Exemplo disso são as construções que estão ocorrendo em toda a cidade, seja no âmbito de mobilidade urbana, edifícios ou, principalmente, intervenções civis voltadas para a COP 30. Parque da Cidade, Parque Linear da Tamandaré, Complexo Porto Futuro, a Nova Doca, o BRT e outras obras estão sendo realizadas simultaneamente às vésperas do evento.
A criação da Avenida Liberdade na região metropolitana, embora vista como um avanço para a mobilidade urbana, tem gerado sérios impactos ambientais, destacando-se o desmatamento e o aumento das ilhas de calor. A remoção de áreas verdes compromete a biodiversidade e a regulação do clima, intensificando o calor urbano e aumentando a demanda por energia elétrica.
Embora essas obras sejam feitas para melhoria e preparação da cidade, o acúmulo de construções em um curto espaço de tempo pode aumentar as ilhas de calor, mesmo com o planejamento ambiental necessário. Esse planejamento visa apenas minimizar os danos causados pelas estruturas, mas não combate completamente seus impactos, o que contribui para o aumento da temperatura.
O histórico de arborização de Belém, tanto nos centros urbanos quanto nas periferias, carece de ações efetivas e benéficas para a infraestrutura. Para se construir uma cidade mais verde, são necessários anos de preparação até que os resultados se tornem visíveis. As ações de arborização da cidade têm um prazo de médio a longo, e todo o processo de transformação não ocorre de imediato.
A população local está na linha de frente das mudanças climáticas. Com a cidade pouco arborizada, moradores reclamam da falta de espaços verdes, principalmente nos bairros periféricos. Antônia Oliveira, moradora do bairro da Terra Firme, queixa-se do calor excessivo e da falta de sombra nas ruas.
“Olha... sinceramente? A cidade já é quente naturalmente, mas sem um ventinho fresco ou uma sombra pra eu me sentar na calçada não dá! A cidade é só concreto, mana, e eu só vejo árvore quando chego mais perto do centro”, diz Antônia.
Relatos como esse são recorrentes, especialmente na temporada de poucas chuvas. O principal objetivo da arborização é proporcionar uma atmosfera de bem-estar para a população. Quando não existe ou é mal gerida, os efeitos são negativos para os moradores.
O professor Luiz Augusto Silva de Sousa, doutor em ciências agrarias, é docente e coordenador do curso de agronomia da UFRA. Com experiência nas áreas de Biologia Vegetal, Ecologia, Educação Ambiental, floricultura e paisagismo, ele compartilha sua visão sobre a arborização da cidade e os desafios enfrentados.
"A arborização serve para isso: ela absorve a radiação e faz com que a sombra proporcione uma temperatura mais amena. Não aquece tanto o asfalto, as calçadas, e o solo fica mais agradável. Quando não tem árvore, o aquecimento na superfície é muito maior, aí formam-se as verdadeiras ilhas de calor”, afirma o professor da Universidade Federal Rural da Amazônia.
As construções em andamento são apresentadas pelos governos como melhorias urbanas para a COP 30, visando o desenvolvimento da cidade com sustentabilidade e criando um legado para a capital paraense. No entanto, a sociedade enfrenta dificuldades para ecoar a temática do evento. Mesmo sendo uma metrópole na região amazônica, Belém ainda não prioriza, de forma concreta, uma cidade mais verde.
Um dos principais obstáculos para a criação de mais áreas verdes é a falta de gestão pública ambiental eficaz. As iniciativas de plantio são pontuais e não levam em consideração fatores como espaço disponível e infraestrutura local. Isso resulta em árvores mal posicionadas, que não conseguem causar os efeitos esperados.
Além da estética e do bem-estar, a elaboração de um plano diretor que integre a preservação das árvores ao desenvolvimento urbano precisa conciliar e incluir a vivência das comunidades periféricas. A maioria das áreas verdes de Belém está concentrada em bairros nobres ou em canteiros centrais das avenidas, como os ipês na Avenida Almirante Barroso.
“Quando há uma iniciativa, é nas principais avenidas, em canteiros centrais. Mas anda gente? Não anda! Apenas carros, e as pessoas andam na sombra do fio elétrico... Poderia ter árvores ali”, comenta Luiz Augusto.
Enquanto o centro da cidade recebe maior atenção em relação às áreas verdes e à infraestrutura, as periferias frequentemente ficam à margem desse planejamento, resultando em ambientes urbanos pouco saudáveis e desconfortáveis. A falta de arborização nas periferias de Belém afeta diretamente a qualidade de vida dos moradores. A escassez de árvores contribui para a elevação das temperaturas, criando ilhas de calor.
Apesar da existência de uma política pública na Câmara Municipal de Belém voltada para a preservação do meio ambiente e a arborização da cidade, a Lei 8.909, de 2012, ainda se mostra insuficiente. Essa situação reflete a carência de manutenção adequada e incentivos para o cumprimento das metas de manejo sustentável. Além disso, o monitoramento dos programas existentes e a avaliação frequente de sua eficácia são essenciais para alcançar resultados duradouros.
Com a aproximação do maior evento sobre ações climáticas, a atual gestão prevê melhorias e atitudes para arborizar e preparar a cidade a tempo da conferência. A prefeitura de Belém está implementando medidas para aumentar as áreas verdes nas ruas e avenidas da capital, como o projeto de arborização na Avenida Almirante Barroso.
Desde o anúncio de que a COP 30 seria realizada em Belém, a cidade recebeu apoio governamental para a implementação de espaços verdes, preparando-a para o evento e criando um legado ambiental. Esse estímulo oferece uma esperança de que a COP traga mudanças duradouras. Apesar de ainda serem insuficientes, essas iniciativas são importantes para o combate às mudanças climáticas.
“Deu-se o primeiro passo para que Belém se modernizasse e constituísse mais espaços agradáveis”, diz o professor.
Por Luiza Amâncio e Marcos Maia
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